quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Amar, verbo intransitivo

Mário de Andrade

Primeiras palavras:

A obra que vamos conhecer aqui é um livro de fácil leitura construído por um dos idealizadores do Modernismo Brasileiro. Sua leitura é a oportunidade de conhecer um pouco dos experimentalismos lingüísticos dos escritores da Modernidade, comprometidos com a construção de uma língua nacional que não fosse artificial, como a dos Românticos, mas que na nossa literatura houvesse, de fato, o falar brasileiro. Você também notará um livro sem divisão formal de capítulos e que tem como ideal primeiro revelar um pouco a sociedade burguesa brasileira do início do século XX. Observe que esse desejo novamente reflete um projeto que já tinha sido iniciado no século XIX quando Alencar, em seus romances urbanos, propunha-se a contar como a sociedade burguesa era. A diferença é que Alencar inventa uma forma comportamental ao passo que Mário, inclusive afirma no próprio livro, produz personagens que não são inventadas e sim retiradas da sociedade onde ele está. Portanto, ao ler esse livro, você conhecerá um pouco do comportamento e valores da nossa sociedade burguesa.

Vale lembrar que essa obra é o primeiro romance escrito por Mário, que sua temática se relaciona com a Novela Senhorita Simpson e que mesma obra há um conto em que Mário de Andrade figura com personagem (O homem sozinho numa estação ferroviária).

Espero que os recortes de texto, as questões e as reflexões propostas aqui sirvam para que você alcance o sonho de ser aluno da UESC em 2011.

Um abraço cordial

Mara Rute Lima

Sobre o autor:

Mais do que participante da Semana Mário de Andrade atuou como um dos criadores da discussão sobre o nacionalismo brasileiro. Foi nesse assunto, um dos maiores estudiosos de seu tempo, prova disso é que nos deixou a obra-prima Macunaíma.

Apesar de ser Modernista criticava seu grupo por não ter gerado em sua arte, preocupações sociais. Mas, mesmo não tendo feito isso contribuiu muito na construção ou consolidação da língua nacional.

Teve uma vida pessoal pacata tendo se dedicado exclusivamente à música, pintura, cultura e literatura. Vale ressaltar que conhecer um pouco mais sobre esse autor é conhecer, por extensão, a Semana de Arte Moderna e o Modernismo 1º Geração.

Sobre a obra:

“Os textos em prosa escritos por Mário de Andrade representam um questionamento das estruturas típicas do romance do século XIX. Em obras como Amar, verbo intransitivo, o escritor deixa claro seu desejo de experimentar diferentes organizações para o texto em prosa, ora eliminando a marcação de capítulos, ora criando um narrador que, mesmo em terceira pessoa atua como uma personagem do livro. Nesse sentido Mário se intromete na história, usando a primeira pessoa, para fazer comentários, expor idéias, mostrar conhecimentos e leituras como de Freud, por exemplo. Tal ação, comum a Machado de Assis, corta o enredo da história e exige paciência do leitor que busca no livro somente a trama. Também faz uso de frase curtinha, picada, gaguejante, cheia de elipses mentais que exigem do leitor redobrada atenção para o seu entendimento.

O romance apresenta vários quadros da vida de uma família de novos-ricos que vivia na cidade de São Paulo na década de 1920. Felisberto Sousa Costa, o patriarca da família, contrata Fräulein Elza, professora alemã, como governanta da casa. Mas, na verdade, ela é uma "professora de amor”, eufemismo que se refere à função de iniciar sexualmente os filhos de burgueses ricos.

O quadro familiar criado no romance representa uma implacável crítica aos burgueses endinheirados e sem cultura, incapazes de lidar com verdadeiros sentimentos, desempenhando cada um o papel que a sociedade capitalista estabeleceu. Várias passagens mostram tais características. É o caso do trecho em que a religiosidade da família Sousa Costa é apresentada como o cumpri­mento de uma praxe social, nada além disso.

Quando Carlos nasceu batizaram-no, pois não. As meninas iam nas missas de domingo, se era manhã de sol, o passeio até fazia bem ... Com nove anos mais ou menos recebiam a primeira comunhão. Dona Laura mandava lhes ensinar o catecismo por uma parenta pobre, muito religiosa, coitada! catequista em Santa Cecília. Dona Laura usava uma cruz de brilhantes que o marido dera pra ela no primeiro aniverrio de casamento. Era uma família católica. [ ... ]

ANDRADE, Mário de. Amar, verbo intransitivo. 18. ed. Belo Horizonte: Vila Rica, 1992. p. 55. (Fragmento).


O narrador contrasta, habilmente, a fé verdadeira da parenta pobre e a religio­sidade marcada pela ostentação da riqueza de Dona Laura. O olhar irônico e crítico para a elite paulistana, que já aparecia em vários dos poemas de Mário de Andrade, explode com força total nas páginas de Amar, verbo intransitivo, em que a família Sousa Costa é ora criticada, ora ridicularizada pelo impiedoso narrador.

No final da obra Mário de Andrade faz uso da técnica cinematográfica que já era comum aos poemas modernistas da primeira geração, ao nos mostrar várias cenas, em ângulos completamente diferentes. Num, focaliza a Fräulein viajando, a despedida, seus pensamentos, seus planos, monólogo interior. Depois mostra Carlos. Em casa, solitário, triste, desinteressado, ainda enrabichado... depois se prolonga um pouco mais para a cena final em que Fräulein já tem um novo aluno: Luís. Estão num corso de carnaval. Uma serpentina que ela atira bate em Carlos. Carlos olha e continua brincando com a holandesa. Carlos continua um machucador. O mundo é tal como é. A gente deve aceitar sem revolta. Carlos casará rico. Perfeitamente. Ela era mãe de amor. Estava até bonita.

Vale ressaltar também que Mário, nessa obra, não foge de seu interesse em retratar as coisas do Brasil já que o livro revela problemas brasileiros, tem uma linguagem brasileira e personagens que são retratos de nossa sociedade.

Adaptado do livro Literatura Brasileira – Tempo, Leitores e Leituras – Editora Moderna

Leia a cena final da obra:

“ (...) Alguém lhe chamou os olhos, conhecido, Carlos? era Carlos com as irmãs na Fiat. Instintivamente ela atirou uma serpentina. A fita rebentou.

- Ah!

Deu um gritinho horrorizada, acertara na testa dele, podia tê-lo ferido ... Carlos olhou. Mandou-lhe um gesto rápido de cabeça, quase saudação. E continuou brincando com a holandesa. Fräulein se doeu, tomou com o baque seco nas entranhas (...) Carlos não fez por mal! foi mostrar que reconhecia e machucou. Frãulein, virando o rosto pra trás, seguiu-o com os olhos, quase amorosa mas já porém reposta no domínio si mesma. Estava muito direito assim! E se venceu completamente com o raciocínio, numa espécie de felicidade. Estava muito certo assim. Ele amaria muito aquela moça. Era bonita. Rica, se via. Carlos casaria bem, na mesma classe. (...) O mundo é tal como é. A gente deve aceitar sem revolta. Carlos casará rico. Perfeitamente.

E uma comoção materna se desencadeou no corpo dela, nem via mais Carlos, os olhos batendo de auto em auto pela gente colorida, Carlos ... José ... Alfredo já casado ... Antoninho também já casado (...) tantos!... tomou-a maravilhosa aluci­nação. Estavam todos por ali amando. Felizes. Habilíssimos. Familiares. Ela era mãe de amor! Estava até bonita. Mãe de amor Mãe ...

Aspectos sociais:

1) O problema central do romance é a educação sexual de um rapaz de família burguesa, em São Paulo. As meninas ficam relegadas a um segundo plano. Carlos é mais importante. Não pode ficar sujeito à ganância e às doenças das mulheres da vida. Como resolver o problema? Contrata-se Fräulein, professor de... sexo. É mais uma estrangeira que entra para a casa brasileira, onde o copeiro é italiano fascista, a arrumadeira é belga ou suíça, o encerador é polaco ou russo. Na casa de Souza Costa o empregado é japonês e a governanta é alemã. Só as cozinheiras que ainda são mulatas ou cafusas. (92 e 93).

2) Há uma referência ao racismo alemão: “quedê raça mais forte? Nenhuma... O nobre destino do homem é se conservar sadio e procurar esposa prodigiosamente sadia. De raça superior, como ela, Fräulein. Os negros são de raça inferior. Os índios também. Os portugueses também.” São as idéias de Fräulein, principalmente depois que leu um trabalho de Reimer, onde se afirmava a inferioridade da raça latina. (33)

3) A família burguesa é patriarcalista: o centro de tudo é o homem, o pai e o filho, Carlos. Todos têm que obedecer ao pater-familias. A começar de D. Laura que se submete, se adapta, aceita as idéias do marido, se conforma com a presença da Fräulein como professora de sexo do filho. E a família vai continuar patriarcalista porque já estão centralizando todas as atenções no filho varão...

4) Nessa família existe também uma religião, certamente velha tradição dos ancestrais. Uma religião de domingo e de tempos de doença... Para que a filha, Maria Luísa, sare, Sousa Costa aceita fazer todos os sacrifícios. Deixará até algumas aventuras fora de casa... “Ora deixemos de imoralidades! Sousa Costa nunca teve aventuras, nunca mais terá aventuras, todos os sacrifícios, porém que minha filha sare!... Sousa Costa pensa em Deus.” (120)

5) Carlos é bem o retrato ou exemplo da nossa sexualidade latina ou brasileira. Com todas as suas minúcias e permissões. Fräulein não compreende bem o amor latino. No amor “o alemão fica. Ponto final. O latino ondula. Reticência”. (152) Para manter a sexualidade de Carlos e a pureza de sua saúde é que Fräulein foi contratada. Carlos precisava de mulher dentro de casa...

6) Tudo passa e muda. A família burguesa, bem composta, bem construída, mantém sua estabilidade. “Um família imóvel, mas feliz.” “A gente vê uma casa... Paz. A casa dorme em silêncio.” (171)

Os aspectos sociais foram retirados de: http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=resumos/docs/verbointransitivo

A questão da professora de amor Fräulein:

A professora de amor é Elza (designada simplesmente por Fräulein, a partir do momento em que adentra no domínio Souza Costa): alemã, trinta e cinco anos, retirante da sua pátria em ruínas, por ocasião da Grande Guerra. Na prática quotidiana, aparentemente, exercerá as funções de governanta e professora de alemão e piano (uma espécie de preceptora), para Carlos e suas três irmãs: Maria Luísa, Laurinha e Aldinha.

Fräulein, no entanto, arrastará vigorosos conflitos por toda a narrativa, que, aliás, serão acentuados no aprofundamento do seu relacionamento com o jovem brasileiro. Tais conflitos estão relacionados à ambigüidade própria do povo alemão que, a todo momento, será lembrada pelo narrador intruso: “No filho da Alemanha tem dois seres: o alemão propriamente dito, homem-do-sonho; e o homem-da-vida, espécie prática do homem-do-mundo que Sócrates se dizia”. (ANDRADE, 1995:.59.)

O inusitado da profissão de Fräulein pode parecer inverossímil numa visão separada da totalidade sócio-econômica e histórica (como também seu sonho de retornar à Alemanha, “depois de feito a América, e o casamento, o vago amado distante à espera de proteção, espécie de redenção wagneriana pelo amor.” Professora de amor, profissão que uma “fraqueza” lhe permitiu exercer, no entanto “é uma profissão”, insistiria Fräulein.

Além da finalidade higienizadora e profilática, a atividade de iniciadora sexual era evitar que a renda familiar fosse desviada para mãos ilícitas. Esta proteção era estendida apenas aos meninos porque as meninas, estas eram explicitamente reprimidas numa época absolutamente machista. Vê-se, pois, aqui com bastante clareza, que Amar, Verbo Intransitivo “é um retrato cruel da sociedade que recusa espaço para o amor em favor de outros valores tidos como primordiais”.

A descoberta de Dona Laura sobre o acordo estabelecido entre Fräulein e o Senhor Souza Costa, referente à iniciação amorosa/sexual de Carlos, provocou explicações desconcertantes, exibindo a hipocrisia social vigente na metrópole paulista:

Laura, Fräulein tem o meu consentimento. Você sabe: hoje esses mocinhos... é tão perigoso! Podem cair nas mãos de alguma exploradora! A cidade... é uma invasão de aventureiras agora! Como nunca teve!. COMO NUNCA TEVE, Laura... Depois isso de principiar... é tão perigoso! Você compreende: uma pessoa especial evita muitas coisas. E viciadas! Não é só bebida não! Hoje não tem mulher-da-vida que não seja eterônoma, usam morfina... E os moços imitam! Depois as doenças!… Você vive em sua casa, não sabe… é um horror! Em pouco tempo Carlos estava sifilítico e outras coisas horríveis, um perdido! (ANDRADE, 1995: 77).


Há de se convir que havia um vasto mercado para a professora de amor, que se fez assim, inclusive, por captar as necessidades e capacidade desse mercado. Ora, antes de vir para a emergente São Paulo, ela esteve no Rio de Janeiro e em Curitiba, “onde não teve o que fazer”.

Vale ressaltar ainda que toda a sociedade de novos-ricos paulista - apresentaram uma necessidade, reconheceram a qualidade do serviço de Fräulein em função da concorrência (as aventureiras e as prostitutas) e ratificaram a utilidade da professora de amor. (...) A justificativa sociológica para a existência da prostituição, conforme o confessam famílias menos preocupadas com a hipocrisia, sustenta-se numa dupla necessidade: preservar a castidade das meninas, que deveriam chegar virgens até o casamento e, ao mesmo tempo, atender à virilidade dos rapazes a quem não ficaria bem tal virgindade ao adentrar à sagrada instituição. Para estes, era desaconselhável que contivessem seus impulsos sexuais; para aquelas, era fácil de controlar uma vez que seus desejos eram menos intensos, como se pensava. Portanto, “as prostitutas, neste caso, eram as guardiãs da moral sexual”. Esta situação se sustentou até a reviravolta dos anos 50/60. A prática de Souza Costa casa-se perfeitamente dentro deste contexto.

E mais, Souza Costa, o chefe da família não pensou apenas na educação intelectual dos filhos. Pras meninas bastava o ensinar-lhes artes e línguas alemã. Mas pro menino, pro Carlos, Souza Costa exigira uma outra lição bem mais grave - a iniciação no amor. E ele bem sabia que numa certa idade os apetites carnais nos meninos dão para pedir saciamento. … então a Fräulein entraria com o jogo para por silêncio nos desejos do menino.

Portanto, Fräulein agrega um valor inestimável aos seus serviços à medida que se insere como uma confortável, discreta e sadia opção (aliás, profilaxia) para as respeitáveis famílias de novos-ricos paulistana.

Atente-se para o fato de que, a professora de amor não é uma prostituta, mas torna-se mercadoria e tem o seu preço: “Fräulein preparava ele. Depois isso não tem conseqüência... Quem me indicou, Fräulein foi o Mesquita, ... Se utilizaram dela, creio que pro filho mais velho.” (...) “Professora de amor... porém não nascera pra isso, sabia. As circunstâncias é que tinham feito dela a professora de amor, se adaptara. Nem discutia se era feliz, não percebia a própria infelicidade. Era verbo ser”

Adaptado de : http://www.filologia.org.br/soletras/3/02.htm

Trechos Comentados:

A moça, depois das cortesias trocadas com a senhora Sousa Costa e um naco de conversa indiferente, subira apenas pra tirar o chapéu. Logo o criado viria chamá-la pro almoço... (...) agora tinha de se arranjar. Alisou os cabelos, deu à gola da blusa, as pregas do casaco uma rijeza militar. Nenhuma faceirice por enquanto[1]. No principio tinha de ser simples. Simples e insexual. O amor nasce das excelências interiores[2]. Espirituais, pensava. O desejo depois.

Quando pronta, esperou imaginando, encostada no lavatório. Ganhava mais oito contos... Se o estado da Alemanha melhorasse[3], mais um ou dois serviços e podia partir. E a casinha sossegada... Rendimento certo, casava[4]... O vulto ideal, esculpido com o pensamento de anos, atravessou devagarinho a memória dela. Comprido magro... Apenas curvado pelo prolongamento dos estudos... Científicos. Muito alvo, quase transparente... E a mancha irregular do sangue nas macas... Óculos sem aro...

Se impacientou. Quis pensar pratico[5], e o almoço? Por que o criado não chegava? A senhora Sousa Costa avisara que o almoço era já. Devia de ser já. No entanto esperava fazia bem uns quinze minutos, que irregularidade. Olhou o relógio-pulseira. Marcava aluado como sempre, ponhamos seis horas. Ou dezoito, a escolha. Havia de acertá-lo outra vez quando chegasse embaixo no hol. Dez vezes, cem vezes. Inútil mandá-lo mais ao relojoeiro, mal sem cura. Em todo o caso sempre era relógio. Porém não teriam hora certa de almoçar naquela casa? Olhou pro céu. Ficou assim.

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Elza desembocara na sala. Carlos, vendo a desconhecida, largou Maria Luisa e encabulou. Pra disfarçar carregou a irmãzinha menor. Machucou. Flautim:

– Mamãe! Mamãe!

Se rindo do chuvisco dos tapinhas, carregando a irmã no braço esquerdo, Carlos ofereceu a mão livre a moça. Voz paulista, certa de chegar no fim da frase. Olhos francos investigando.

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Elza consolava a pecurrucha, com meiguice emprestada. Não sabia ter meiguice[6]. Mais questão de temperamento que de raça, não me venham dizer que os alemães são ríspidos. Tolice! conheci.

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Elza porem desde o primeiro instante se apresentara tão conhecida, tão trilhada e de ontem! O desembaraço era premeditado não tem dúvida, mas lhe saia natural e discreto. Isto se descontaria dentre as facilidades das raças superiores... Porem tal razão e assuntar apenas a epiderme da experiência. Antes, estou disposto a reconhecer nela essa faculdade prática de adaptação dos alemães[7] em terra estranha.

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Nas noites espaçadas em que Sousa Costa se aproximava da mulher, ele tomava sempre o cuidado de não mostrar jeitos e sabenças adquiridos lá embaixo no vale[8]. No vale do Anhangabau? É. Dona Laura comprazia com prazer o marido. Com prazer? Cansada. Entre ambos se firmara tacitamente e bem cedo uma convenção honesta: nunca jamais ele trouxera do vale um fio louro no paleto nem aromas que já não fossem pessoais. Ou então aromas cívicos. Dona Laura por sua vez fingia ignorar as navegações do Pedro Álvares Cabral[9]. Convenção honesta se quiserem... Não seria talvez a precisão interior de sossego?... Parece que sim. Afirmo que não. Ah! ninguém o saberá jamais![10]...

E quem diria que Sousa Costa não era bom marido? era sim. Fora tão nu de preconceitos até casar sem por reparo nas ondas suspeitas dos cabelos da noiva. E bem me lembro que ficaram noivos em tempo de calorão... Dona Laura retribuía a confiança do marido, esquecendo por sua vez que bigodes abastosos e brilhantinados são suspeitos também. Sentia agora eles trepadeirando pelo braço gelatinoso dela e, meia dormindo, se ajeitando:

Vendeu o touro?

Resolvi não vender. E muito bom reprodutor.

Dormiam[11].

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Não vejo razão pra me chamarem vaidoso se imagino que o meu livro tem neste momento cinqüenta leitores. Comigo 51. Ninguém duvide: esse um que lê com mais compreensão e entusiasmo um escrito e autor dele. Quem cria, vê sempre uma Lindóia na criatura, embora as índias sejam pançudas e remelentas[12].

Volto a afirmar que o meu livro tem 50 leitores. Comigo 51. Não é muito não. Cinqüenta exemplares distribui com dedicatórias gentilíssimas. Ora dentre cinqüenta presenteados, não tem exagero algum supor que ao menos 5 hão de ler o livro. Cinco leitores. Tenho, salvo omissão, 45 inimigos. Esses lerão meu livro, juro[13]. E a lotação do bonde se completa. Pois toquemos pra avenida Higienópolis!

Se este livro conta 51 leitores sucede que neste lugar da leitura já existem 51 Elzas. E bem desagradável, mas logo depois da primeira cena, cada um tinha a Fräulein dele na imaginação. Contra isso não posso nada e teria sido indiscreto se antes de qualquer familiaridade com a moça, a minuciasse em todos os seus pormenores físicos, não faço isso. Outro mal apareceu: cada um criou Fräulein segundo a própria fantasia, e temos atualmente 51 heroínas pra um só idílio.

51, com a minha, que também vale. Vale, porém não tenho a mínima intenção de exigir dos leitores o abandono de suas Elzas e impor a minha como única de existência real[14]. O leitor continuara com a dele. Apenas por curiosidade, vamos cotejá-las agora. Pra isso mostro a minha nos 35 atuais janeiros dela.

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Descrição de Fräulein

Não é clássico nem perfeito o corpo da minha Fräulein. Pouco maior que a média dos corpos de mulher. E cheio nas suas partes. Isso o torna pesado e bastante sensual. Longe porém daquele peso divino dos nus renascentes italianos ou daquela sensualidade das figuras de Scopas e Leucipo. (...) Nenhuma espiritualidade. Indiferente burguesice. (...) Isso do corpo de Fräulein não ser perfeito, em nada enfraquece a história. Lhe dá mesmo certa honestidade espiritual e não provoca sonhos. E alias se renascente e perfeito, o idílio seria o mesmo. Fräulein não e bonita, não. Porem traços muito regulares, coloridos de cor real. E agora que se veste, a gente pode olhar com mais franqueza isso que fica de fora e ao mundo pertence, agrada, não agrada? Não se pinta, quase nem usa pó-de-arroz. A pele estica, discretamente polida com os arrancos da carne sã. O embate e cruento. Resiste a pele, o sangue se alastra pelo interior e Fräulein toda se roseia agradavelmente.

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Preste bastante atenção nessa reflexão que o autor faz!

No filho da Alemanha tem dois seres: o alemão propriamente dito, homem-do-sonho; e o homem-da-vida, espécie pratica do homem-do-mundo que Socrates se dizia.

O alemão propriamente dito e o cujo que sonha, trapalhão, obscuro, nostalgicamente filosofo, religioso, idealista incorrigível, muito serio, agarrado com a pátria, com a família, sincero e 120 quilos. Vestindo o tal, aparece outro sujeito, homem-da-vida, fortemente visível, esperto, hábil e europeiamente bonitão. Em principio se pode dizer que é matéria sem forma, dútil H2O se amoldando a todas as quartinhas. Não tem nenhuma hipocrisia nisso, nem máscara. Se adapta o homem-da-vida, faz muito bem. Eu se pudesse fazia o mesmo, e você, leitor. Porém o homem-do-sonho permanece intacto. Nas horas silenciosas da contemplação, se escuta o suspiro dele, gemido espiritual um pouco doce por demais, que escapa dentre as molas flexíveis do homem-da- vida, que nem o queixume dum deus paciente encarcerado.

O homem-da-vida e que a gente vê. Ele criou no negócio dele artigo tão bom como o do inglês. Cobra caro. Mas não vê que um comprador saiu com as mãos abanando por causa do preço. Adapta-se o homem-da-vida. No dia seguinte o freguês encontra artigo quase igual ao outro, com o mesmo aspecto faceiro e de preço alcançável. Sai com os bolsos vazios e as maos cheias. O anglo da fabrica vizinha, ali mesmo, só atravessar um estirão de água zangada, não vendeu o artigo dele. Não vendeu nem vendera. E continuara sempre fazendo-o muito bom.

Eu admirava mais o inglês se só este conseguisse manipular a mercadoria excelente, porem o alemão homem-da-vida também melhora as coisas até a excelência. Apenas carece que alguém vá na frente primeiro. Isso o próprio Walter de Rathenau observou, grande homem!... Homem-do-sonho. Os outros que inventem. O alemão pega na descoberta da gente e a desenvolve e melhora. E piora também, estabelecendo uma tabela de preços a que podem abordar bolsas de todos os calados. Dai, aos poucos, todo o mundo ir preferindo o comerciante alemão.

Os países de exportação industrial viam o fenômeno, de cara feia. O homem-da-vida observava a raiva da vizinhança... E se lá nas trevas interiores, onde se reúnem as assombrações familiares, o homem-do-sonho também cantava o seu Home, sweet home que a nenhuma raça pertence e é desejo universal, o homem-da-vida se adaptava ainda. Construía canhões pelas mãos brandas duma viúva. Armazenava gases asfixiantes, afiava lamparinas pra cortar futuramente os imaginários bracinhos (...)

Aceitemos mesmo que engordasse a idéia multissecular, universal e secreta, da posse do mundo... Não culpe-se por ela o homem- do- sonho. O da-vida e que se observando vitorioso no mundo concluía que era muito justo lhe caber a posse do tal. Quem que errou forte e incorrigivelmente? Só Bismarck. Alguém chamou esse homem de ultimo Nibelungo... Nibelungo, não tem dúvida. Conseguiu Alsácia, ouro do Reno, pela renuncia do amor.

Enquanto isso todos os países da terra, abraçados, se amavam numa promiscua rede comum, não é? Estávamos no primeiro decênio deste século que deu no vinte. Todos os abraçados perdiam terreno. O homem-da-vida ganhava-o. Por adaptação? E. Será? (...)

Culpa de um, culpa de outro, tornaram a vida insuportável na Alemanha. Mesmo antes de 14 a existência arrastava difícil lá, Fraulein se adaptou. Veio pro Brasil, Rio de Janeiro. Depois Curitiba onde não teve o que fazer. Rio de Janeiro. São Paulo. Agora tinha que viver com os Sousa Costas. Se adaptou.

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Vejam por exemplo a Alemanha, quede raça mais forte? Nenhuma[15]. E justamente porque mais forte e indestrutível neles o conceito da família. Os filhos nascem robustos. As mulheres são grandes e claras. São fecundas. O nobre destino do homem e se conservar sadio e procurar esposa prodigiosamente sadia. De raça superior, como ela, Fräulein. Os negros são de raça inferior. Os índios também. Os portugueses também.

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A aritmética nunca foi propícia aos brasileiros. Nós não somamos coisa nenhuma[16]. Das quatro operações, unicamente uma nos atrai, a multiplicação, justo a que mais raro freqüenta os sucessos deste mundo vagarento.

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Um dia, era uma quarta-feira, Fräulein apareceu diante de mim e se contou. O que disse aqui está com poucas vírgulas, vernaculização acomodatícia e ortografia. Os personagens, é possível que uma disposição particular e momentânea do meu espírito tenha aceitado as somas por eles apresentadas, essa toda a minha falta. Porém asseguro serem criaturas já feitas e que se moveram sem mim. São os personagens que escolhem os seus autores e não estes que constroem as suas heroínas. Virgulam-nas apenas, pra que os homens possam ter delas conhecimento suficiente. Segunda e mais forte razão: Afirmarem que Fräulein não concorda consigo mesma... Mas eu só queria saber neste mundo misturado quem concorda consigo mesmo! Somos misturas incompletas, assustadoras incoerências, metades, três-quartos e quando muito nove-décimos. Até afirmo não existir uma só pessoa perfeita, de São Paulo a São Paulo, a gente fazendo toda a volta deste globo, com expressiva justeza adjetivadora, chamado de terráqueo[17].

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E se quiserem coisa ainda mais grata, é lembrar a fábula discreta contada por Platão no Banquete[18]

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Carlos esses três dias viveu? Eu não sei se alcançar a felicidade máxima, extasiar-se aí, e sentir que ela, apesar de superlativa, inda cresce, e reparar que inda pode crescer mais... isso é viver? A felicidade é tão oposta à vida que, estando nela, a gente esquece que vive. Depois quando acaba, dure pouco, dure muito, fica apenas aquela impressão do segundo. Nem isso, impressão de hiato, de defeito de sintaxe logo corrigido, vertigem em que ninguém dá tento de si. E fica mais essa idéia que retomasse de novo a vida, que das portas do Paraíso Terrestre em diante é sofrer e impedimento só. Estou convencido: Carlos não viveu esses três dias.

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— Senhora está chamando e não dava o recado. O tigre alemão tinha que descer as escadas e ir saber o que dona Laura queria. Na mesa, muita vezes o nipônico deixava de servir o tedesco ou esbarrava nele com peso e malvadez. Mas o tigre alemão se vingava, e o senhor ou a senhora Sousa Costa ali, ordenava ao inimigo tal serviço, o tigre japonês obedecia servilmente. Era na alma que rosnava tiririca. E assim os dois tigres se odiavam. Viviam se arranhando em contínua rivalidade. Cada um se acreditava o dono daquela família, o conquistador da casa e do jardim, o quem sabe? futuro possuidor do Estado e próximo rei da terra brasileira toda do Amazonas ao Prata[19].

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Carlos se levantou tarde. Desapontado? É certo que, descendo pro café, deu graças a deus de não encontrar Fräulein, bebeu, subiu escorraçado pelos sustos. Tomou o banho frio quotidiano, e cantava, distendendo os músculos morenos diante do espelho, nu. Coroava os olhos dele essa quebra de pálpebras, vocês sabem... como brilham as pupilas! É sono. Mas em volta delas, sombria, negrejante, a aliança matrimonial. De Saturno[20].

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O fato de Carlos não lhe ter dado a inocência, preocupava-a. Sejamos sinceros: aquilo machucou-lhe o orgulho profissional.

Mais do que esse sentimento inútil, logo seqüestrado, Fräulein discutia se os oito contos lhe escapavam ou não, certo que não! Porém lhe faltava descanso agora, pra provar o não, Carlos estava ali. Só não cruzava as pernas mais, queixo nas mãos, cotovelos nos joelhos. (...) Fräulein, pelos dias adiante, pensou duas vezes longamente no caso. Seriamente. Foi honesta. Resolveu ficar bem quieta e aceitar os oitos contos. A missão dela não consistia em dirigir um ato: ensinava o amor integral, tão desnaturado nos tempos de agora!... Amor calmo, etc.[21]

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Cena do deslace já esperado entre Carlos e Fräulein

Carlos entrara no quarto de Fräulein. Mal tivera tempo de. Porém já machucara a amante, cruzando as pernas sentado. Tátão, tão, tão!

— Abra!

Meu Deus! entra Sousa Costa

— Que está fazendo aqui, diga!

— Nada, papai...

Flébil, flébil, nem se ouvia. Sousa Costa acreditou que era um grande artista dramático. Voltou-se pra Fräulein. Por lembranças românticas franziu a testa.

— Ela não tem a culpa!

De pé agora, relampeando em nítida franqueza, heróico.

—O senhor tenha a bondade mas é de ir já pro seu quarto! Já vou lá também!

Carlos baixou a cabeça, partiu. Francamente: não soube que partia. Não soube que chegou no quarto. Não soube que se encostou na guarda da cama, senão caía mesmo, plorúm! desmanchado no chão. Não soube o tempo que passou. Nada. Enxergou a porta se abrindo. Ergueu a cara pro pai:

— Ela não teve a culpa, papai!

Não relumeava mais, mas sem imploração também. Emperrado apenas na própria verdade: quando uma mulher erra, só o homem é que tem a culpa. E, sem nenhuma temeridade, corajoso.

— Você está louco! Você sabe quem é essa mulher! E se ela agora te obriga a casar! Está muito bonito!

Carlos aterrado, casar! Que explosão de luz essa no cérebro! Luz ruim. Mas o apego a Fräulein subjuga todos os preconceitos, sociedade e futuro desaparecem, só Fräulein, o conchego de Fräulein fica. E ainda um pouco de coragem, cabeçudo. Flébil, flébil:

— Eu caso, papai...

— Bobo! Você não está vendo que é uma aventureira!

— Não é uma...

— Cale-se!

— Papai! mas ela não é uma aventureira! Agora implorava. Que dó fazia na gente!

— Carlos, você é uma criança, Carlos! e não sabe nada, ouviu! E agora! E se tiverem um filho, como é! diga!! maluco...

Ah! isso acabou Carlos. Caiu numa cadeira, chorou. Sousa Costa já estava cansado também. Sentou-se e falou manso. Aliás por pouco tempo, nem reparou que não ensinava nada. Viu o filho chorando e teve amor, consolou. Felizmente ele estava ali pra acabar com aquilo. Porém que tivesse cuidado pra outra: não tem tantas mulheres sem perigo por aí, não o obrigasse mais a gastar dinheiro com essas coisas. Carlos tira a cara das mãos, quer ver se o dinheiro é verdade.

— Ela não recebeu dinheiro!

— Ah?! então você pensa que ela partia assim, sem nada, não é!...

— Quando!

Que dinheiro, nem baixezas! Fräulein partia! só isso Carlos escutou.

— Quando?

— Quando?! essa é muito boa! o mais depressa possível amanhã cedo.

— Não! papai! não! Eu não faço mais nada!

— Como é! então você!!! Mas Carlos você está maluco duma vez! Parte! e é pena que não possa partir já, agorinha mesmo!

Perdia terreno. Voltou à idéia do filho, com que vencera de-já-hoje. Carlos recomeçou a chorar. Era horrível! casar ainda, mas ter um filho... UM FILHO! Não era impossível! que medo! E como! Depois! Meu Deus! um filho... Um filho...

— E agora o senhor vai-me deitar e nada de barulhos, ouviu? Eu já falei que arranjo isso. Mas fique aí bem quieto e durma!

Saiu.

Um filho...

Um filho.

Um filho...

Um... filho?

Meu Deus! UM FILHO.

Se atira na cama.

... um filho...

Horroroso! Não raciocinava, não pensava.

... um FILHO...

Nem assombrações amedrontam assim! E Carlos não acredita em assombrações. Carlos espaventado, exausto, antes morrer!... Mas a noção da morte o acalma e retempera. Carlos Principia se defendendo, pois não tem a menor intenção de morrer. Um filho?! Mas viria mesmo um filho?... Fräulein teria um fi... Fräulein partia... Vem a figura de Fräulein. Mata o filho. Que filho nem nada! Fräulein! O desejo de Fräulein. 0 desespero por ela! Não tem nada, tem Fräulein! o corpo dela, o calor dela... Carlos vai. Pra que precauções? Vira o trinco. Porta fechada, naturalmente. Empurra-a. Sacode-a com força. Se lembra de bater e bate.

(....)

— Meu filho... acorde, meu filho!
— Que é mamãe...

Se ergueu sobressaltado, ainda sem pensamento.

— Meu filho, Fräulein vai embora... Você não quer se despedir dela? mas seja homem, Carlos!
Carlos de pé. Mal calçou os chinelos, se arranjar pra que! Sujo de sono se atirou na porta, desceu as escadas, ficaram perdidos no abraço. Chorando ele mergulhava a cara nas roupas desejadas. Nem lhes gozava o cheiro lavado. Fräulein, entre lágrimas, sorriu assim:
— Meu filho...

Sousa Costa repuxava os bigodes, bolas! Porém lhe doía a dor do filho. Dona Laura descia os últimos degraus. Um dos chinelos de Carlos estava ali.

Era preciso partir.

— Adeus, Carlos. Seja... muito feliz, ouviu? adeus...

Beijou-o na testa. Na testa, tal-e-qual fazem as mães. O beijo foi comprido por demais.

Se desvencilhava. Dona Laura ajudou.

— Filhinho... não faça assim!...

Os braços dele foram ficando vazios. Os braços dele ficaram compridos no ar. Ficaram compridíssimos. Foram descendo cansadíssimos. Teve uma vaga lembrança de que nem a beijara. Não, só um verbo naturalista: não aproveitara. E agora nunca mais. Porta que fecha. Sonolência. Não chorava. Foi andando. Parou calçando o chinelo. Subia os degraus.

Fräulein sacudida pelos soluços nervosos entrou no automóvel. Partiam mesmo. Debruçou-se ainda na portinhola:
— Meu Carlos...

Nada. Só Tanaka fechando o portão, se rindo. E uma casa fechada, toda num amarelo educado, senhorial. VILA LAURA. Quis lutar. Tolice sofrer sem causa. Derrubou-se pra trás largada, desinfeliz. Sousa Costa olhava de soslaio pra ela, sem compreender.

No primeiro andar a janela se abriu, que rompante! Carlos engoliu avenida, buscando ver, querendo ver, vendo, o automóvel que sabia sem saber estava longe nunca mais, deserto só. Não estendeu os braços. Não gritou. Porém o olhar turvo escorreu pela avenida até onde! meu Deus...

Os raros transeuntes da aurora viam na janela um mocinho chorachorando, coitado! decerto perdeu a mãe...

Na estação Sousa Costa foi comprar o bilhete. Fez Fräulein entrar no vagão.

— Muito obrigada, senhor Sousa Costa. E... acredite, oh! acredite... desejo a felicidade de Carlos!
— Acredito, Fräulein. Muito obrigado.

Exausta, meia triste ela olhava sem reparar a carreira das campinas. Estação de São Bernardo? Pensava. Quase sofria. Carlos. Era muito sincero, corajoso. Ora! E a raiva contra todos os homens quase que fez ela se rir, prevendo o desastre. Afastou com energia o ódio inútil. Se protegeu contra a imaginação, pensando no dinheiro. Assegurou-se de que a maleta estava ali, estava. Oito contos. Mais dois ou três serviços e descansava. Apesar de tudo, Carlos... que alma bonita, um homem. Tomou-a novo relaxamento de vontades. Doía. Talvez o amasse? Fräulein murmurou severamente o "não", quase que os outros escutaram. Sorriu. Uma ternurinha só. Muito natural: era um bom menino, e não pensemos mais nisso. Estava muito calma.

E o idílio de Fräulein realmente acaba aqui. O idílio dos dois. O livro está acabado.

FIM

O livro ainda continua...

O que virá depois será a vida de Carlos seguindo adiante e de Fräulein também, até aquele reencontro que já apresentamos em que Carlos está com sua possível esposa e Fräulein com Luis, seu mais novo aluno.

Atenção! Não deixe de fazer a leitura completa da obra.



[1] O autor aqui já sugere que a governanta adotará distintos comportamentos.

[2] Essa é uma das referências que o livro apresenta sobre a concepção do amor para Fräulein. É interessante que você busque ter ao menos um conjunto de suas reflexões sobre o amor para um possível questionamento.

[3] O livro sempre apresenta Fräulein e sua ligação com a terra natal deixada por causa da guerra.

[4] Apesar de ensinar o amor e ter no livro uma postura racional. O livro revela o lado sonhador de Fräulein que imagina voltar para Alemanha e casar-se. Veja que ela não tem como tipo ideal o homem brasileiro e que já tratamos do preconceito que perpassa a visão dessa personagem.

[5] Reiteração do sentido prático, racional e pontual de Fräulein.

[6] Mais um traço da personalidade da governanta.

[7] Sobre a questão racial.

[8] Denúncia da infidelidade.

[9] Percebem a metáfora?

[10] Observe a forma como lida o narrador no texto.

[11] Retrato das relações do casal.

[12] O autor comenta sobre sua obra parando a narrativa ( digressão – lembre-se de Machado). E aqui ainda afirma que quem cria personagens tem tendências a idealizá-la.

[13] Construção de uma fina ironia de Mário, um autor que recebeu fortes críticas por suas inovações modernas.

[14] Claramente afirma que sua personagem é um retrato social.

[15] Preconceito racial.

[16] Várias vezes no livro o autor sinaliza elementos de nossa identidade.

[17] Observe a afirmação do autor sobre sermos paradoxais e sobre Fräulein existir de fato.

[18] Nessa obra Platão faz inúmeras referências ao amor. Se quiser ler, o livro está disponível na internet.

[19] Esse trecho revela a luta entre o emprego japonês e Fräulein a alemã pela conquista da casa – seu espaço no território brasileiro.

[20] Carlos, depois de ter se deitado com Fräulein.

[21] Fräulein descobre não ter sido a primeira de Carlos, mas acredita que isso não faz diferença já que será ela a ensiná-lo como é amar.

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